Traição e crueldade

(Jornal Matéria Prima - 12.12.08)

O que pode levar um homem a trair e praticar atos maldosos?

Como serão vencidas as barreiras morais e psicológicas para a ação fria e deliberada, quando se sabe, com precisão, o efeito nefasto que causarão? Ao contemplar a própria família e, naturalmente, se enternecer, não sentirá asco de si mesmo quem preparar para famílias alheias a dor e a flagelação?

Pois bem, essas reflexões me ocorreram várias vezes nos últimos dias acompanhando a luta dos permissionários do TCTAU (“perueiros”), além de ter ciência do que aconteceria com dezena de cobradores da ABC.

Nas assembléias e conversas particulares o clima de tensão, revolta e insegurança, tornava o ar denso, pesado. Às vésperas do Natal, a expectativa de se ver subitamente desempregado e com dívidas recém-contraídas para pagar, alterava o ânimo, o raciocínio e o equilíbrio.

E qual era a ameaça que pairava sobre essas cabeças e quem o autor delas?

Começo pelo fim: o autor, Roberto Peixoto, homem não propriamente famoso por seu brilho e probidade administrativa, mas tido como “humano”, “cordial”.

E ameaça?  O projeto de lei de Peixoto, apreciado pela Câmara, que extinguia, de uma penada, entre outras maldades, 25 permissões para o TCTAU, com conseqüência de demissão imediata de 25 motoristas e 25 cobradores, e a possibilidade de demissão de todos os cobradores da ABC, através da revogação de lei do ex-vereador Miguel Figueira que proíbe a circulação de ônibus e vans apenas com motoristas.

E tudo isso seria aprovado quase automaticamente na Câmara, sem quase nenhuma apreciação do seu alto teor de maldade.

Entre outras coisas, impressionou-me a falta de coragem: se movido por compromissos assumidos com quem quer que seja, mas não com o bem-comum (que foi traído), Peixoto deveria ter, pelo menos, a hombridade de declarar, de forma inequívoca: “projeto visando a demissão de trabalhadores”.  Mas é claro que a forma apresentada era outra: “Revoga-se a Lei n. 2.038/83”, a dos cobradores.

Seria irreal esperar tamanha sinceridade não é mesmo? Lembro-me da declaração de um meliante que dizia “não roubar, mas só fazer, no fundo, a vontade dos trouxas que deixavam suas carteiras ao seu alcance”. Ou seja, a censura moral, inibe até mesmo os criminosos de admitirem, friamente, que comentem o mal. Há sempre uma desculpa, um subterfúgio.

Mas esse homem não agiu sozinho. Depois de muita negociação e pressão conseguimos reverter, em primeiro lugar, a possibilidade de demissão dos cobradores. Pois bem, sorrateiramente um vereador simpático a empresários tentou introduzir uma emenda clandestina que permitia a demissão dos cobradores nos micro-ônibus. E hoje, na televisão, o bancário Dr. Valdir Aguiar (cycle toy transit PhD), do Partido dos Trabalhadores - PT, que ora é dublê de “diretor de trânsito”, e um dos autores da barbaridade, disse que a medida (que impediu as demissões de trabalhadores) foi um “retrocesso”. 

Por fim, quem sabe possa ser uma pista para entender o comportamento de Peixoto, e de seus comparsas, o fato que o projeto de lei foi encaminhado à Câmara dois dias, repito, dois dias, depois das eleições, além de que o número proposto de vans (52) vem sendo defendido há muito tempo pela ABC.

 Joffre Neto, ex-Presidente da Câmara Municipal, Mestre em Administração Pública e doutorando em Ciência Política, é professor universitário e Presidente de honra do PDT .

Comentários

Anônimo disse…
Prezado Joffre Neto, acompanhei sua palestra hoje em São José dos Campos - SODEBRÁS- XII CONGRESSO INTERNACIONAL. Um assunto muito interessante. Por duas vezes, procurei vereadores para dois problemas importantes:

1- fui aprovada em terceiro lugar num concurso público e não fui chamada.
2- melhorias na praça do meu bairro. Brinquedos velhos , enferrujados e morcegos.

O mesmo vereador me atendeu com relação ao concurso e ao pedido de melhoria da praça do meu bairro.

Nos dois pedidos, observei mobilização, certo interesse , mas a questão não saiu do papel nos dois casos. Não houve nenhuma resolução prática. Minha colega de faculdade e eu - ficamos a ver navios e esperando as promessas do vereador no sentido de averiguar o que havia acontecido. Eram seis vagas para o cargo de psicólogo e foi chamado apenas o primeiro lugar. Isso foi há mais de 10 anos e jamais tive uma resposta substancial sobre isso.

No caso da praça do bairro, o vereador enviou um ofício à Prefeitura solicitando à reforma da praça. Recebi , em minha casa, cópia do ofício encaminhado à Prefeitura. Mas depois nada mais...

A Prefeitura nada respondeu.

Onde está o erro? "Uma andorinha somente não faz o verão?" Como o senhor mesmo explicou- as pessoas desconhecem as funções dos vereadores e da Câmara atualmente.

Como deve proceder o indíviduo em sua comunidade sendo o vereador representante do povo?
Reuniões de Câmara? Nunca assisti. E, apenas ouço comentários quando acontece alguma rixa ou desentendimento.


Obrigada,

Sandra Cecília

relax.mental@uol.com.br
Anônimo disse…
Como profissional do comportamento humano faço minhas reflexões. Quando a C.P.I começou as investigações sobre o mensalão, deputado Roberto Jefferson, etc, etc e etc... Pensei com meus botões... Como era o lar desses políticos? Pai? Mãe? O que foi ensinado pelos pais? Por que a desonestidade grassa na vida de alguns políticos sem nenhuma culpa ? Egoísmo? Desejo de poder? Imaturidade psíquica?
Para mim é falha de caráter, faz parte da evolução moral desse político.
Lembro-me do grande furor que houve na mídia quando do assassinato dos pais da jovem Susana . O promotor afirmou mais ou menos assim:
"Ela está arrependida porque foi descoberta, se não fosse..."
Nossos valores morais traçam o nosso perfil. E eles não se dobram às tentações, dólares na cueca, fraude no SUS e por aí vai...

Infelizmente, o único político que se retratou com galhardia, coragem até hoje confessando erros e falcatruas, foi ROMILDO ROSA- o personagem deputado da novela FAVORITA....

Se é verdade que a arte imita a vida, a vida imita a arte...

quem sabe um dia........

tudo mudará........
RicBrSp disse…
Oi Joffre,
Recebi um e-mail seu só c/ o título desta postagem, q acabei d ler, e comento....
Comentário genérico....
Leia se tiver tempo no meu blog, meus textos sobre política leia bem o q eu tc sobre o Brasil república, que a corrupção já vem há muito, e uma das facetas da corrupção, é exatamente este tipo que vc denuncia em seu texto.
Nos últimos anos as greves e manifestações da categoria de motoristas e cobradores da Capital, orquestradas entre patrões, e sindicato, onde chega ao ponto de abrir os portões das garagens p/ os ônibus participarem das manifestações públicas, que interrompem a circulação da população, mas o interesse delas não é em favor da situação do trabalhador, e sim só dos patrões, como forma de pressionar a Prefeitura em reajustar as tarifas.
Estas coisas e muito mais o correm em todas as casas legislativas do Brasil, seja federal, estadual, ou municipal, a grande maioria, as casas, se reúnem só p/ prejudicar o Brasil, uma minoria inexpressiva de projetos que tem haver com a coisa, com o bem comum, com o interesse público.
O Executivo, pelo presidente desta coisa pública chamada Brasil, e suas medidas provisórias refletem este estado de coisas, onde não atendem nem aos princípios (requisitos) básicos das medidas provisórias.
Será que um dia, tudo vai passar, ficar só no passado?
Abraços,
Ricardo
Unknown disse…
primeiro é preciso descobrir pra quem eles estão legislando, sim pq em época de eleição é para o povo, depois fico na duvida sera que é pra quem pode mais?
Informalidade disse…
Entendo este texto mais como uma crítica aos autores do projeto de lei do que propriamente ao projeto. Nesta toada, há de se salientar o papel do nosso atual prefeito, o qual omite a verdade de seus pareceres, ludibriando uma população que o tem como líder popular. Este não passa de um severo opressor das massas, por meio das suas campanhas assistencialistas medíocres, seja por suas ameaças aos funcionários públicos.

Realmente Roberto Peixoto nada surpreende por estes atos. Esperemos o próximo feito deste seu personagem.

Douglas

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