"Menino Jesus da minha aldeia"

(Para meu mui querido amigo Zeymard, que o Menino já levou para Si)


Poema do Menino Jesus   Fernando Pessoa

Num meio-dia de fim de Primavera  Tive um sonho como uma fotografia.  Vi Jesus Cristo descer à terra.  Veio pela encosta de um monte  Tornado outra vez menino,  A correr e a rolar-se pela erva  E a arrancar flores para as deitar fora  E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Hoje vive na minha aldeia comigo.  É uma criança bonita de riso e natural.  Limpa o nariz ao braço direito,  Chapinha nas poças de água,  Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.  Atira pedras aos burros,  Rouba a fruta dos pomares  E foge a chorar e a gritar dos cães.  E, porque sabe que elas não gostam  E que toda a gente acha graça,  Corre atrás das raparigas  Que vão em ranchos pelas estradas  Com as bilhas às cabeças  E levanta-lhes as saias.

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.  Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.  Ele é o humano que é natural.  Ele é o divino que sorri e que brinca.  E por isso é que eu sei com toda a certeza  Que ele é o Menino Jesus verdadeiro. 
E a criança tão humana que é divina  É esta minha quotidiana vida de poeta,  E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.  E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação,  E o mais pequeno som, seja do que for,  Parece falar comigo. 
A Criança Nova que habita onde vivo  Dá-me uma mão a mim  E outra a tudo que existe  E assim vamos os três pelo caminho que houver,  Saltando e cantando e rindo  E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte  Que não há mistério no mundo  E que tudo vale a pena.    A Criança Eterna acompanha-me sempre.  A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.  O meu ouvido atento alegremente a todos os sons 
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.   Damo-nos tão bem um com o outro  Na companhia de tudo  Que nunca pensamos um no outro,  Mas vivemos juntos e dois  Com um acordo íntimo  Como a mão direita e a esquerda.

Comentários

Unknown disse…
Lindooo!!!!
André disse…
Olá Joffre,
realmente emocionante o poema.
Desculpa pelo "fora de pauta", mas gostaria de compartilhar um desabafo sobre o descaso e o desgoverno em Taubaté. Mais uma sobre o lixão a céu aberto que Tauabté está se tornando. Abs,

http://interiworld.blogspot.com/2010/01/lixo-em-taubate-cidade-nao-pode-virar.html
Renata disse…
lindo poema !!!!!!!! quem sabe vem participar conosco do próximo sarau que fizermos, declamando este poema

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